quarta-feira, 26 de julho de 2017

A Viagem

Nunca fui de me apaixonar facilmente. Talvez isso também tenha a ver com o facto de eu não ser a pessoa-tipo por quem facilmente os outros se apaixonam. Ou talvez uma coisa não tenha nada a ver com a outra, afinal, o facto de nos apaixonarmos por alguém nada tem a ver com os outros se apaixonarem ou não por nós. Mas ainda assim, nestes jogos, há sempre um que corre mais atrás do outro e o outro pode-se deixar apanhar, pode fugir, pode ficar no seu canto, ou pode simplesmente aceitar jogar o jogo e ver no que a coisa vai dar. 

Se eu corri mais ou deixei-me apanhar mais vezes? Não sei, mas acho que a coisa deve estar mais ou menos a fazer. Acho que na maior parte das vezes nem nós mesmos sabemos se estamos a correr atrás ou se estão a correr atrás de nós. Simplesmente, às vezes, é bom ter uma companhia ao longo do caminho, e não sabemos muito bem se essa companhia vai chegar ao fim da viagem ou se vai sair umas estações antes.  

As viagens são longas. E muitos são os caminhos que cada pessoa percorre e os diferentes caminhos de diferentes e desconhecidas pessoas cruzam-se constantemente, muitas vezes sem sequer esperarmos ou estarmos predispostos para que nos acompanhem. Eu não sei se é karma, se é destino ou nenhum dos dois, mas ainda assim, somos sempre nós que decidimos se determinada pessoa pode entrar nas nossas vidas ou não. E se entra, somos sempre nós que decidimos caminhar junto com ela, ou quando é que ela terá de seguir a sua viagem sozinha. 

Comigo, infelizmente, nesta longa viagem que é a vida, tem-me acontecido inúmeras vezes de eu cruzar no caminho de outras pessoas, que também elas andam nas suas viagens e, muitas vezes sem nos apercebermos, decidimos seguir viagem juntos. Mas digo infelizmente, porque algum tempo depois, passe muito ou pouco tempo, muitas acabam por embarcar por outras linhas e decidem não me acompanhar.

Via Pinterest
No que ao amor diz respeito, é preciso (pelo menos para mim é) que eu caminhe durante um bom tempo sozinho até que deixe alguém acompanhar-me. Para mim tem sempre sido preciso tempo. Muito tempo. Não é tempo para esquecer porque eu nunca vou esquecer, mas é preciso que o tempo cicatrize e me cure de alguma forma. E não é de uma enfermeira que eu preciso, ainda que brincar aos médicos pudesse ser engraçado. Mas é mesmo de tempo, só de tempo que eu preciso. 

Lembro-me perfeitamente que já tinha passado muito tempo, quando certa noite, num bar do Porto, uma jovem que lá trabalhava a recolher copos, que eu tinha acabado de conhecer (apesar de termos combinado qualquer coisa num fórum da net) e que já estaria bem bebida, de repente, começa-me a meter a mão, por dentro da roupa. Parecia que era tudo dela. Mas não era. Aquilo além de me causar arrepio, deixou-me um pouco desconfortável. Tanto tempo depois, era a primeira vez que uma mulher me punha a mão no pelo. Literalmente. Até então, durante muitos anos, eu só havia sido tocado pelas mesmas mãos que eu tão bem sabia como me tocavam. E aquelas eram umas mãos estranhas para mim. No fundo, senti-me até como se estivesse a trair. Evidentemente que não a mulher que há muito já havia decidido seguir viagem por outra linha, rumo a um novo destino, na companhia de outra pessoa, mas era como se me estivesse a trair a mim. Como se traísse o sentimento por aquela pessoa,e que estava tão enraizado dentro de mim. Era como se eu não pudesse. E eu podia. Podia tudo que eu quisesse com aquela jovem alcoolicamente com o pito aos saltos. Podia mesmo tudo.

E o tempo vai passando e novas pessoas cruzam o nosso caminho e interagem connosco. Ao mesmo tempo, a estação daquela pessoa que antes caminhava connosco e desceu para seguir viagem sem nós fica cada vez mais para trás, mais distante. Às vezes até é confuso.Temos saudades do passado e ao mesmo tempo saudades do presente. Mas o novo começa a ficar cada vez mais presente nas nossas vidas, dia após dia, após dia. Passado e presente distanciam-se lentamente. Novas e frágeis ilusões se criam, muitas vezes para se desmoronarem mais à frente de novo. Mas seja como for, nós temos sempre de prosseguir viagem...

4 comentários:

  1. Como compreendo, a velha máxima deverá ser esta penso eu: são precisos dois no "barco do amor" a remar na mesma direcção, essa direcção pode ser óbvia para ambos, criada pelo dialogo e partilhada, ou apenas existente na mente de um, então ai o barco anda à deriva, em círculos; ser quem se é, continua a valer e é mesmo a unica coisa que vale, pois com capas diversas, amam-se as capas ou o que elas não mostram, amam-se ilusões, mais ainda confunde-se tantas vezes luxuria com amor, que exige sacrifico, e desapego para verdadeiramente acontecer, e os caminhos que falaste, bom, se eles se desencontram daqueles que trilhámos, é porque não era amor, era uma ilusão que alimentámos, pelo menos para uma das partes, mas antes trilhar vários caminhos que se desencontram do que nunca ter caminhado sequer... mais uma vez um texto right on the spot.

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    1. Os meus textos quando abordam temas pessoais, raramente são muito evidentes. É possível que uma qualquer pessoa amiga (e contam-se pelos dedos as pessoas que me conhecem e que vão lendo os meus blogues) leia determinado texto mais pessoal e nem sequer saiba em concreto a quem me estou a referir.
      Muitas vezes também começo a escrever com uma ideia na cabeça - e neste texto o título que eu tinha na cabeça era "entre amores" - mas depois deixo-me levar ao sabor do meus pensamentos. E se eu gostar minimamente do que saiu (mesmo que esteja uma merda) ou pelo menos, fizer alguma coerência para mim, até porque em primeiro lugar este blogue é para mim, então eu clico em publicar.
      E neste texto eu referia-me à nossa viagem (espiritual se quiseres) que é a vida, e sobre os encontros e desencontros que vamos tendo. Mas referia-me a todas as pessoas com que nos cruzamos, aquelas pessoas especiais que encontramos e nos dizem muito, sejam amigos(as) ou namoradas(os). E eu por norma apego-me muito às pessoas de quem gosto, e claro, depois não é fácil vê-las afastarem-se.
      Quanto ao amor, bom, comigo não tem sido muito fácil (talvez o karma tenha as costas largas), ou então, é muito provável que as pessoas também compliquem demais. Mas às vezes não é mesmo fácil...

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  2. Eu não acho que o facto dos caminhos se desencontrarem signifique imperativamente que não seja amor, ou que seja uma ilusão...
    Há tantos motivos que podem levar a isso. Não significa necessariamente que não há amor, não mesmo...
    SF

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    1. Olá SF,
      Creio que estavas a opinar acerca da ideia deixada pela primeira que comentou. Eu também sou dessa opinião. Nem sempre tudo é preto ou branco. Começa logo na fase em que as pessoas se encontram e na vida que têm nesse momento. Uma coisa é estar a estudar e começar a namorar aos 17 anos, outra completamente diferente é estar com trinta, quarenta ou cinquenta anos, ter um emprego estável e uma vida estável etc. Há muitas variáveis... há pessoas que imaginam uma vida com filhos, outros como eu nunca pensaram em ter filhos; há pessoas que se encontram e são de longe, e se umas convivem muito bem com isso, outras relações acabam por sofrer um imenso desgaste. Há, como dizes, imensos motivos que podem levar a um afastamento estratégico, apesar das pessoas gostarem muito uma da outra... Ainda que eu ache que, se as pessoas gostam muito uma da outra, não há motivos para simplesmente desaparecerem...

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